Artigo de André Soares - 10/12/2011
Inúmeros
poetas foram célebres em nos revelar a felicidade recôndita nos
meandros da vida, a exemplo de Casimiro de Abreu, em sua poesia “Meus oito anos”, descrevendo suas belas lembranças dessa idade, em especial. Não nos esqueçamos de Gonçalves Dias, em seu poema “Canção do Exílio”,
primoroso hino de amor ao Brasil, homenageando as privilegiadas belezas
naturais da nossa Pátria-Mãe. Todavia, se Casimiro de Abreu e Gonçalves
Dias, dentre outros, nos encantaram com o saudosismo de belas
reminiscências, Ataulfo Alves foi magistral em advertir-nos da tristeza
de não se ter consciência da verdadeira felicidade, e do sofrimento de
encontrá-la perdida irrecuperavelmente no próprio passado. Assim,
Ataulfo Alves eternizou o triste lamento “...Eu era feliz e não sabia!”, com o qual termina a sua bela e antiga canção “Meus tempos de criança”,
referindo-se à felicidade irreversivelmente encoberta no passado de sua
infância gloriosa, cujo esplendor infelizmente apenas tardiamente soube
reconhecer.
Na
verdade, esta consagrada obra de Ataulfo Alves retrata a tragédia da
vida de muitas pessoas que somente encontram a felicidade depois de
tê-la perdido definitivamente; cujo maior sofrimento está em saber que
desprezaram essa dádiva quando a tiveram inteiramente ao seu dispor.
Quantos
compatriotas somente reconheceram o valor do heroísmo de seus
antepassados na conquista do legado histórico de seu país depois que sua
nação sucumbiu em crises e guerras!...; quantos filhos ingratos somente
reconheceram o valor da dedicação e amor de seus pais depois que eles
deixaram essa vida!...; quantas pessoas irresponsavelmente imaturas
somente reconheceram o valor de terem encontrado o verdadeiro amor de
suas vidas depois que o destruíram com o seu egoísmo e traição!...
Pois, “...Eu era feliz e não sabia!” é o arrependimento a que estes estão condenados, por terem navegado suas vidas em mares traiçoeiros onde “... é preciso perder para dar valor...”.
Isso porque não souberam cultuar os reais valores dessa vida; não
souberam reverenciar a sabedoria dos mestres; não souberam corresponder e
dignificar-se ao amor verdadeiro; e porque se esqueceram que a vida só é
vivida uma vez, que cada momento é único e não volta mais, e que a
qualquer instante (por mais que isso demore) não estaremos mais aqui.
Meus oito anos
Casimiro de abreu
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
Como são belos os dias
Do despontar da existência!
- Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar - é lago sereno,
O céu - um manto azulado,
O mundo - um sonho dourado,
A vida - um hino d'amor!
Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar!
O céu bordado d'estrelas,
A terra de aromas cheia
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar!
Oh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera!
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã!
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minhã irmã!
Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Da camisa aberta o peito,
- Pés descalços, braços nus -
Correndo pelas campinas
A roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis!
Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo.
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
- Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
A sombra das bananeiras
Debaixo dos laranjais!
Canção do exílio
Gonçalves Dias
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar –sozinho, à noite–
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que disfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.