quarta-feira, 12 de setembro de 2012

A Abin e a Satiagraha

Artigo de André Soares - 14/06/2011

A recente condenação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o festival de clandestinidades protagonizadas e acobertadas pela Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), na Operação "Satiagraha", em 2008, onde atuaram uma centena de seus agentes, levando o então presidente Lula a afastar imediatamente o seu Diretor-Geral, Paulo Lacerda, e toda a cúpula da ABIN, desvelando a maior e pior crise institucional de inteligência de nossa história; revela não apenas a gravidade da ilegalidade das ações cometidas pela ABIN contra o próprio estado brasileiro, como principalmente o seu preocupante desvirtuamento ético-moral. Porque, não bastasse a condenação judicial do estado contra a sua atuação vergonhosa e abjeta, verifica-se que recrudesce em setores da ABIN o vigor dessa mentalidade deturpada, deformada e criminosa. 

O que deve fazer um integrante de serviço de inteligência que toma conhecimento de irregularidades e crimes que estão sendo cometidos internamente pelos seus dirigentes contra a sociedade e o estado; e que estão sendo acobertados sob o manto do sigilo legal? 

Pois, mais de uma centena de integrantes da ABIN, que viveram essa situação na 'Satiagraha', nada fizeram. Ao contrário, as apurações realizadas pela Polícia Federal (PF) e Comissão Parlamentar de Inquérito das interceptações telefônicas (CPI do Grampo) expuseram à sociedade as ações praticadas pelos agentes da Abin, que durante meses agiram clandestinamente; em promiscuidade com ex-agentes; sem controle; ferindo de morte a doutrina de inteligência; à revelia da legalidade; a serviço de interesses personalistas e escusos; atentando contra o próprio Estado; e confiantes na mais completa impunidade, certos de se esconderem sob o manto do sigilo institucional. Não fosse o acaso de terem sido descobertos, sabe-se lá que prejuízos mais teriam sido causados ao país. Pois, dentre todos esses homens e mulheres da ABIN, não houve sequer um(a) honrado(a) e corajoso(a) cidadão(ã) a denunciar esse estado de coisas. Mais estarrecedor é que quando chamados à responsabilidade nas investigações da PF e da CPI seus dirigentes mentiram descaradamente à nação brasileira, a começar pelo dirigente máximo da ABIN, maculando o lema máximo desse órgão de inteligência que reza trabalhar "em defesa do Brasil".

Essa não é uma questão afeta meramente à consciência pessoal e de foro íntimo. Não há nem mesmo qualquer dilema a ser analisado, que supostamente justificaria um conflito de ordem filosófica. Essa é uma questão extremamente simples e objetiva, pois trata-se unicamente do respeito à legalidade, ao Estado democrático de Direito da nação brasleira e, principalmente, do cumprimento da nossa Constituição Federal, ao qual todos os brasileiros e brasileiras estão obrigados por dever de cidadania.

A verdade sobre a ABIN, já sobejamente conhecida pela sociedade e comprovada por sua história de escândalos e ineficiência, é que essa organização divorciou-se das sábias palavras proferidas pelo coronel Walther Nicolai, chefe do serviço de inteligência do chanceler Bismarck, que profetizou: 

"A Inteligência é um apanágio dos nobres. Confiada a outros, desmorona".
Sempre desmorona, pois somente os dotados de inabalável fortaleza ética e moral, cujo perfil se caracteriza sobretudo pelo exemplo e pela coragem, são dignos para o exercício da Inteligência. Portanto, que esse vergonhoso capítulo da história da Inteligência de Estado no Brasil seja devidamente apurado e seus responsáveis sejam rigorosamente punidos, e que a sociedade brasileira não mais se esqueça
 da sabedoria alardeada há tempos pelo coronel Walther Nicolai. Pois, na Inteligência só há dois tipos de profissionais: os corruptos e os que "vão prá guerra".

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