quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Os novos desafios da Inteligência de Estado no Brasil

Os novos desafios da Inteligência de Estado no Brasil
Artigo de André Soares - 15/04/2012
 
  
“Não imaginei que havia criado um monstro” foram as célebres palavras de arrependimento proferidas pelo General Golbery do Couto e Silva ante a degenerescência do Serviço Nacional de Informações (SNI), criado pela lei 4.341, de 13 de junho de 1964, que culminou com sua extinção no governo Fernando Collor de Melo e do qual foi um dos principais idealizadores. Como o presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) não se afastou dos erros passados ressuscitou no Brasil o fantasma do antigo SNI, instituindo no país a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), pela Lei 9883, de 07 de dezembro de 1999, como órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN); divorciando a inteligência brasileira das sábias palavras do coronel Walther Nicolai, chefe do serviço de inteligência do chanceler Bismarck, que profetizou: “A Inteligência é um apanágio dos nobres. Confiada a outros, desmorona".
Com pouco mais de uma década de existência, a história da ABIN se caracteriza por sua escandalosa e generalizada ineficiência, contaminando o SISBIN e por uma sucessão de escândalos e crises institucionais de âmbitos nacional e internacional, cujas danosas conseqüências implicaram a exoneração de vários de seus diretores-gerais, ao longo dos governos FHC e Lula. Atualmente, o Brasil sofre a maior e pior crise institucional de inteligência sem precedentes na sua história, incipientemente desvelada à sociedade no festival de clandestinidades da Operação Satiagraha, criminosamente patrocinadas pela direção-geral e toda a cúpula da ABIN, em 2008.
Contudo, no epicentro desse caos que vive a Inteligência de Estado no Brasil, a ABIN e o SISBIN continuam uma "caixa preta" invencível, sem controle, em flagrante atentado contra o estado democrático de direito vigente, obscuramente protegida pela impunidade, inação e esquecimento de nossos governantes sobre seus crimes praticados contra o estado brasileiro, cujos culpados nunca foram responsabilizados; e sob a cumplicidade dos órgãos de controle, dos poderes executivo, legislativo, judiciário e do ministério público.
Se por um lado é incontestável a importância da Inteligência no contexto do estado constituído, já alardeada à humanidade desde a antiguidade e nos ensinamentos de Sun Tzu, a grave realidade que aflige o país é que a principal estrutura do seu sistema imunológico se degenerou numa grave doença cancerígena. Destarte, urge à sociedade se contrapor ante esse intolerável estado de coisas que assola a Inteligência de Estado no Brasil porquanto piores contingências ainda acometerão os desígnios do país, decorrentes da corrupção que domina nossos serviços de inteligência e que desconhecidamente está na gênese dos mais vergonhosos escândalos e tragédias nacionais.
Portanto, há muito por fazer e os novos desafios são muitos. A começar pela promulgação de uma Política Nacional de Inteligência, pois a sua inexistência fomenta o desvirtuamento dessa atividade; a revisão e aperfeiçoamento dos nossos diplomas legais, começando pela embrionária e equivocada Lei 9883, que cria a ABIN; a estruturação de um verdadeiro e legítimo sistema nacional de inteligência, que prime pela ética e legalidade de suas ações, congregando os poderes da república, ministério público e entes federativos; a ruptura da “caixa preta” dos serviços de inteligência nacionais, cuja prestação de contas deve submeter-se impiedosamente ao princípio constitucional da publicidade; a renovação dos cargos de direção da ABIN, dominados pelos apaniguados da “comunidade de inteligência”, que se perpetua subjugando nossos governantes pusilânimes sob o temor da ameaça de um pseudo poder retaliador; e a responsabilização direta, funcional e criminal de todos os operadores de inteligência pelo seu desempenho, a começar pelos dirigentes máximos dos serviços de inteligência.
Que a firme decisão da presidenta Dilma Rousseff ao promulgar a Lei 12.527, de 18 de novembro de 2011 que regula o acesso a informações previsto na Constituição Federal, e sua determinação presidencial de instaurar a “Comissão da Verdade” para resgatar o nosso recente e perdido passado histórico, seja o ensejo corajoso e auspicioso que faltou aos seus predecessores para exterminar definitivamente a “monstruosidade” que governa os serviços de inteligência nacionais, inaugurando uma nova e eficiente Inteligência de Estado no Brasil, que seja verdadeiramente apanágio dos nobres e dignos cidadãos brasileiros.

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